Ela por ela - meditando no Amor

Era uma mulher rígida e prática.
"Não gosto de transmitir emoções", afirmava ela, transmitindo orgulho.
Trabalhara toda a vida numa só empresa, dedicando-se aos assuntos dos recursos humanos e o seu papel era o de demitir o pessoal menos apto ou.. menos desejado.
À medida que ela descrevia pormenorizadamente como tinha despedido este ou aquele, ia-se lhe revelando um sorriso e um olhar no horizonte absolutamente poético.
Eu sou pintor, nada faço por dinheiro - o amor é o que me move - e, por isso, desenvolvi um raciocínio sobre esta senhora: a tristeza dos outros é a sua musa inspiradora.
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-> Enquanto fumo um cigarro no meio da floresta e descubro os tons da bondade, da beleza e do equilíbrio, dou pela senhora a mastigar uma estratégia que a permita magoar um novo ser-humano.
-> Enquanto dou uma pincelada suave, revelando-se na tela outrora branca uma vegetação e um céu de várias cores, dou por ela a despedir um nobre trabalhador que, sem trabalho, não terá como alimentar os seus filhos.
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Porventura, o amor desta senhora é o não-amor. A sua verdadeira paixão é demonstrar não-paixão.
Debrucei-me então sobre uma reflexão muito bela, consequente da nossa Língua Portuguesa: a expressão "ela por ela", utilizada frequentemente para ilustrar casos em que o nada leva a lado nenhum.
Quem diz que o amor que eu tenho é melhor que o dela? Será que o casal de namorados no banco de jardim tem um amor melhor que nós todos? Afinal, na minha perspectiva de artista, o amor, seja qual for a situação, não nos leva a lado nenhum, sendo um nada que vivemos tão intensamente.
Por Cohen, Magalhães in Meditações da vida suína

Obrigado.
É um belo retrato que este texto pinta. Faz lembrar as gaivotas, que disparam os seus dejectos sobre outrém, não por desmérito mas apenas por ser o que lhes enche a alma. Enchamos as nossas almas com os nossos amores mal amados!
ResponderEliminarO melhor amor magoa
EliminarPenso que o Amor [para quem nele acredita após os 15/16 anos de idade], ao contrário de outros estados de espírito, não deve estar sujeito a qualquer medida qualita ou quantitativa.
ResponderEliminarOu se ama, ou não.
Porra
EliminarM. Cohen
Issuh, Issuh!
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